quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

A VERDADEIRA CERTEZA DE SALVAÇÃO

Retomando o parágrafo I da Confissão de Fé, após a afirmação da existência da falsa convicção, lemos o seguinte: “...contudo, os que verdadeiramente crêem no Senhor Jesus e o amam com sinceridade, procurando andar diante dele em toda boa consciência, podem, nesta vida, certificar-se de se acharem em estado de graça, e podem regozijar-se na esperança da glória de Deus, essa esperança que jamais os envergonhará.”
Esta declaração da Confissão de Fé deixa claro que, segundo as Escrituras, existe não somente uma certeza de salvação, mas, também, uma certeza verdadeira de salvação. Todavia, para tornar clara a diferença entre a falsa e a verdadeira certeza de salvação, alguns pontos precisam ser enfatizados aqui. O primeiro diz respeito à fé daquele que verdadeiramente é salvo: “verdadeiramente crêem no Senhor Jesus”; com isto, aponta-se para o fato de que os verdadeiros salvos não olham para si mesmos como merecedores da salvação; na verdade, têm eles a compreensão correta de sua incapacidade para adquirí-la, e por isso lançam-se, totalmente, confiantes em Jesus, nos benefícios conquistados por Ele, o único justo, na cruz do calvário. Assim, a verdadeira certeza de salvação pertence àqueles que depositaram toda a sua fé na obra de Jesus Cristo, não procurando em si mesmos méritos para alcançá-la.
O segundo aspecto diz respeito à disposição do coração daquele que verdadeiramente encontrou a salvação em Jesus: “O amam (a Jesus) com sinceridade”. Sproul, comentando esta disposição interior daquele que é verdadeiramente salvo, diz que:
Uma pessoa regenerada tem recebido a operação interna do Espírito Santo, através da qual a inclinação ou disposição da alma tem sido alterada. O coração regenerado possui um amor e desejo por Cristo que não é encontrado no incrédulo.

Infelizmente, com o sentimentalismo barato de nossa geração, amar passou a significar “satisfação pessoal”, e não doação por outrem, como ensina a Escritura Sagrada. Assim, amar Jesus passou a ser entendido como “cantar” músicas melosas para Ele em vez de compromisso com seu reino e sua vontade. Por isso, não vemos mudança de atitudes, de comportamentos, na suposta “geração de apaixonados” por Jesus, pois o amor que expressam não passa de satisfação pessoal expressa em suas canções. O amor que Cristo requer de nós implica em sinceridade e doação pessoal.
Quando falamos de sinceridade, falamos da intenção dos nossos corações. Cristo tem que significar tudo para nós, não parte, mas tudo; ele não divide a sua glória com qualquer outra coisa ou pessoa (Lc 14.25-33). Se buscamos a Cristo por causa de algum problema que possuímos (dinheiro, casamento, emprego, etc.), e O aceitamos por recebermos a dádiva desejada, isto nos cega para a nossa real necessidade dele. Quando amamos a Cristo sinceramente O aceitamos por estarmos conscientes de nossa culpabilidade diante de Deus, da gravidade do nosso pecado e do estado de nossa naureza diante de sua santidade, o que nos impede de nos salvarmos a nós mesmos. Assim, corremos para Cristo como a dádiva de Deus-Pai para a nossa salvação e a Ele nos entregamos por inteiro. Ele, então, passa a ser o bem maior que possuímos, e não as dádivas passageiras que possamos receber dele. Um coração sincero deseja e ama o redentor Jesus, e não as bênçãos que Ele pode dar, de tal forma que, se Ele nada me der de material nesta vida, Ele, em si, já será o suficiente para a minha plena alegria.
O amor expresso a Cristo se vê, também, na doação pessoal, tal como expressa na Confissão de Fé, quando diz: “procurando andar diante dele em toda boa consciência”, ou seja, os que amam a Cristo procuram viver de forma agradável ao seu Senhor, de forma que suas consciências não os acusam de denegrirem a imagem daquele que os amou e redimiu. Ninguém que diga estar em Cristo e anda nas trevas fala a verdade, antes, a si mesmo se engana e caminha a passos largos para a condenação (1 Jo 1.5,6). Não importa quantas vezes você vá a igreja, cante louvores a Cristo, faça orações e leia a Bíblia; se a sua vida não desejar a santidade requerida por Ele, e não pautar suas decisões de vida a partir da honra que Ele requer, você estará entre os que se enganam para a perdição da alma. A salvação requer de nós integridade, desejo de pureza e santidade; assim, é incompatível a vida em Cristo e a vida no pecado.
Considerando estes pontos, podemos afirmar que, ainda nesta vida, pode o crente se assegurar de sua salvação. Reisinger nos diz que esta certeza se fundamenta sobre a infalível Palavra de Deus, as graças das quais a Palavra fala ao coração do crente e o testemunho do Espírito de nossa filiação divina (Rm 8.16). Ou seja, a certeza se fundamenta na declaração que a Escritura Sagrada faz quanto aos salvos, e não em nossos sentimentos quanto à matéria, pois o nosso coração é enganoso, e em muitos momentos poderemos até sentir uma certa insegurança, mas a Palavra de Deus nos assegura que se “estamos em Cristo”, somos novas criaturas (2 Co 5.17), e isto deve dissipar as dúvidas dos nossos corações quando Satanás tentar nos abater com palavras de condenação: “Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica” (Rm 8.33).

sábado, 20 de dezembro de 2008

A CERTEZA DE SALVAÇÃO À LUZ DAS ESCRITURAS - A FALSA CERTEZA DE SALVAÇÃO (II)

A parábola dos fundamentos, contada por Jesus, aponta para uma realidade muito triste e perigosa: muitas pessoas se enganam quanto à sua salvação, não examinam sua fé, sua vida, seu coração, e por isso caminham iludidos para o inferno, achando caminhar para o céu. Isto nos faz questionar: o que impede as pessoas de enxergarem a verdade sobre si mesmas, sobre o estado de suas almas? R.C. Sproul ("A Alma em Busca de Deus", ed. Eclesia, p. 158), acredita que a falsa convicção de salvação pode ser atribuída a um entre dois erros fatais: ou a uma falsa compreensão das condições, ou exigências, da própria salvação, ou a uma falsa avaliação quanto à nossa capacidade de satisfazer às exigências da salvação. Ele afirma: “a primeira é uma análise defeituosa da salvação; a segunda, uma análise defeituosa de nós mesmos”.
O entendimento errado da salvação, das suas exigências, leva o homem ao engano, banalizando a seriedade daquilo que ela representa e do sacrifício exigido por ela. Assim, Sproul alista quatro análises defeituosas da salvação que levam as pessoas a descansarem num fundamento insólito, inseguro e condenarório. A primeira é o universalismo que ensina que Cristo assegurou a salvação para toda a humanidade. Sproul responde a este ensino lembrando que, se isto é verdade bastaríamos estar seguros de pertencemos à raça humana. E isto independeria de continuarmos em pecado ou não. E se isto é assim, que sentido tem a palavra “salvação”? Se todos herdarão os céus, seria uma grande incoerência falar de pessoas salvas, uma vez que ninguém estaria perdido. Ao contrário deste ensino a Palavra de Deus insiste que “todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Rm 3.23).
A segunda análise defeituosa diz respeito ao ensino da justificação pelas obras, a qual ensina que, se as pessoas assumirem uma vida boa, ou forem boas o suficiente, estarão salvas. Para Sproul há dois erros gravíssimos com este ensino: primeiro, ele nega a justificação exclusiva pela fé; segundo, faz uma avaliação errada da capacidade do ser humano, como se este fosse capaz de fazer boas obras, ou obras boas o bastante para satisfazer às exigências da lei de Deus, a qual requer perfeição. A Bíblia afirma, claramente: “Não há quem faça o bem” (Sl 14.3). Somente Jesus cumpriu a lei de Deus perfeitamente, e somente por meio dos seus méritos somos justificados diante de Deus.
A terceira análise defeituosa nos leva a pensar que a filiação à uma comunidade de fé é o suficiente para alcançarmos a salvação. Entretanto, Jesus reconheceu que as pessoas podem honrá-lo com seus lábios enquanto seus corações continuam distante dEle. Talvez este seja o maior perigo em nossos dias, confundirmos a confissão de fé salvífica em Jesus, com uma confissão denominacional. Percebe-se este perigo quando vemos inúmeros testemunhos televisivos apontando para o bem que denominação x ou y fez na vida de determinada pessoa por causa de “bênção” alcançada. As evidências da conversão (arrependimento e fé em Cristo para a salvação), sequer são mencionadas em tais testemunhos. Todavia, as pessoas se sentem seguras por pertencerem àquela igreja de onde auferiram a “graça” que buscavam. O fato de receber uma bênção de Deus não nos assegura salvação; como evidência disto, lembremos a história dos 10 leprosos, onde apenas 1 alcançou a salvação (Lc 17.11-19); ou lembremos, ainda, as palavras do próprio Senhor Jesus: “muitos são chamados, mas poucos escolhidos” (Mt 22.14).
A quarta, e última, análise defeituosa sobre a salvação refere-se ao pensamento de que basta que a pessoa seja religiosa que alcançará a salvação. Por religiosa se entende, ou se quer dizer, alguém que, além de praticar os ritos religiosos de algum grupo, procura viver de forma digna, com ética, a sua vida. Novamente caímos no problema da má compreensão de nossa natureza humana: somos pecadores, portanto, não podemos fazer, absolutamente, nada isento de pecado. Além disso, ainda que alguém pudesse viver de forma íntegra, não poderia viver sem pecar, o que já a tornaria merecedora de julgamento, pois se o céu é um lugar perfeito, não cabe, ali, pessoas imperfeitas.
Reforça esta última análise defeituosa da salvação um dito popular que afirma que “todas as religiões levam à Deus”. Entretanto, as Escrituras afirmam, claramente, que a salvação ocorre exclusivamente por meio de Jesus, e que todas as religiões pagãs são repugnantes para Deus, pois roubam a glória de Deus e a transformam em glória de homens. Qualquer religião que negue a fé em Cristo como caminho para a salvação é mentirosa, enganadora.
O segundo caso que produz uma falsa convicção de salvação, segundo Sproul, é uma análise equivocada de nós mesmos. Ainda que saibam que a salvação se dá exclusivamente pela fé, as pessoas são tentadas a pensarem em suas atitudes como merecedoras da salvação. Há uma idéia de que somos participantes, com Deus, do processo salvífico. Ora, a Escritura declara que estamos “mortos em nossos delitos e pecados” (Ef 2.1), e se estamos mortos, como tal, não temos como responder a nada, nem fazer qualquer coisa por nós mesmos. Por isso a Bíblia fala da salvação como um “nascer de novo”, ou seja, voltar à vida; mas isto não se refere à reencarnação, como deturpam os espíritas esta frase. O que se quer dizer com “nascer de novo” é a necessidade de voltar a viver espiritualmente, sendo capaz de responder ao chamado de Deus e de fazer a sua vontade, tal como expressa em sua lei. Neste sentido, somente Deus pode nos fazer viver novamente por operação do seu Santo Espírito que aplica em nós o perdão e a vida conquistados por Cristo Jesus em sua morte e ressurreição.
Como a falsa convicção de salvação é um ensino claro nas Escrituras, precisamos tomar cuidado para que não nos encontremos sustentados sobre os nossos esforços vãos. Enquanto persistir em nós a mínima idéia de que somos salvos por nossos esforços, corremos o risco de nos enganarmos quanto à nossa salvação e, lamentavelmente, nos encontrarmos totalmente perdidos. Enquanto nossos corações e fé não repousarem plenamente na obra de Cristo, em sua morte e ressurreição, devemos questionar o sentimento religioso que há em nós, pois aqueles que, verdadeiramente, são salvos, tem testificado em seus corações, por meio do Espírito Santo de Deus, que, de fato, são filhos de Deus (Rm 8.16).

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

A CERTEZA DE SALVAÇÃO À LUZ DAS ESCRITURAS - A FALSA CERTEZA DE SALVAÇÃO (I)

Continuando nosso estudo, examinemos, agora, a doutrina, em si, da certeza de salvação. Para fins didáticos, tomaremos como base para a nossa análise a sistematização da doutrina tal como se apresenta na Confissão de Fé de Westminster, capítulo XVIII, por considerarmos que o trabalho desenvolvido pelos teólogos puritanos ingleses, do século XVII, foi de grande envergadura acadêmica e espiritual, delineando, claramente, aquilo que a Escritura Sagrada expõe sobre o tema. Vejamos, então, os pontos relevantes, e chaves, da matéria em apreço.
1) Existe uma falsa certeza de salvação.
Às vezes ouço a seguinte objeção à doutrina: "Fulano de tal era um crente fiel a Jesus, participava de todas as atividades da igreja, pessoa consagrada, mas de repente, se desviou, foi para o mundo e se perdeu. Como explicar isso? Esta pessoa continua salva apesar disso?”
O grande problema, neste caso, é a mentalidade de conversão que adquirimos com a teologia defendida por Charles Finney (para um entendimento do estrago que Finney produziu na teologia cristã sugiro a leitura do artigo “Adoradores ou Consumidores: o outro lado da herança de Charles G. Finney, de Augustus Nicodemus Lopes, que pode ser baixado no site www.monergismo.com). De acordo com Finney, a salvação era obtida por uma decisão manifesta pela pessoa por meio de um gesto. Assim, ele introduziu a idéia do apelo após a mensagem e a insistência para que a pessoa “aceitasse” a Cristo. Se, então, ela levantasse a mão, isto indicaria que estava salva.
O que acontece neste tipo de pregação é que a salvação passa a ser uma decisão da vontade da pessoa, e não um “nascer de novo”, como Jesus ensinou em Jo 3, quando falando com Nicodemus disse: “Quem não nascer da água e do Espírito não pode entrar no reino de Deus...importa-vos nascer de novo” (v. 5,7). Observe, há uma obra que se opera em nós, não é algo resultante de nossa vontade pessoal, mas da ação de Deus sobre nós. Para que isto fique claro o Senhor Jesus acrecenta um comentário: “o vento sopra onde quer, ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai; assim, é todo o que é nascido do Espírito” (v.8). É o Espírito quem opera e faz nascer o filho de Deus redimido, e não a vontade pessoal por si mesma.
É por causa disto que o parágrafo I da Confissão de Fé assim inicia o assunto: “Ainda que os hipócritas e os demais não-regenerados possam iludir-se vãmente com falsas esperanças e carnal presunção de se acharem no favor de Deus e em estado de salvação, esperança essa que perecerá...”
Este parágrafo da Confissão de Fé nos alerta para o fato de que existem pessoas que experimentaram algum tipo de fé e deixaram-se iludir pela mesma, achando tratar-se da fé salvífica. Entenda: as pessoas naturais, não-convertidas, têm um tipo de fé natural, fruto da sua confiança em algo. Mas esta confiança precisa de algo visível, palpável para projetar-se. No caso da fé a mesma não é palpável, visível, assim, o homem natural projeta sua fé em si mesmo, naquilo que pode e quer acreditar. Por isso, sua fé não pode salvá-lo, a menos que experimente um “novo nascimento”, uma experiência que o faça romper consigo mesmo para projetá-lo em Cristo. Bem, é isto o que o Espírito Santo faz, ele nos tira da confiança pessoal (na verdade, Ele desmonta todo o nosso sentimento de confiança pessoal), e nos faz olhar para Cristo, para o Calvário, e nos faz compreender que ali estávamos sendo punidos, e pelo sangue do cordeiro sendo reconciliados. Isto não é mero assentimento inlectual, é uma experiência de renovação da mente; não é mera confiança pessoal, é sentimento de incapacidade pessoal e necessidade de um salvador. Assim, não é o assentimento da vontade que nos salva, como defendia Finney, mas a experiência de novo nascimento (espero tratar disso melhor num próximo estudo).
O que caracteriza este novo nascimento? Essencialmente a mudança da disposição da vontade. Antes amávamos o mundo e tudo o que havia no mundo; nascido de Deus, passamos a amar a Deus e a sua Lei, pois é na sua Lei que encontramos a sua vontade expressa. Quem diz amar a Deus e rejeita a sua Lei, de fato não O ama, mas permance nas trevas; quem diz amar a Deus, mas continua amando as coisas do mundo (baladas, prostituição, músicas pecaminosas, etc.), de fato não conheceu a luz de Cristo; quem diz amar a Deus e continua escravo do pecado, de fato não conhece a Cristo, não nasceu de novo.
Assim, aqueles que um dia estiveram na igreja, participaram ativamente, se mostraram dedicados e consagrados e “caíram”, não voltando mais para o Senhor, de fato não nasceram de novo, e a fé que um dia professaram era falsa, longe do fundamento, que é Cristo. Esta fé que expressaram não era aquela produzida pelo Espírito de Deus que leva o ser humano à regeneração. Conseqüentemente, estas pessoas, em algum tempo, viram sua fé desfalecer ou ser desmascarada.
Ernest C. Reisinger ("Lord & Christ: the implications of lordship for faith and life", Phillipsburg, New Jersey: P&R Publishing. p.114), nos lembra que é por causa da possibilidade da decepção religiosa que o Novo Testamento nos adverte muitas vezes sobre crentes espúrios. Em Mateus 7. 22 Jesus nos fala daqueles que no último dia dirão: “Senhor, Senhor! Porventura não temos nós profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não fizemos muitos milagres?” E Jesus lhes responderá: “Nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniqüidade.”(v.23).
Este texto aponta para duas marcas que podem nos fazer confundir a verdadeira fé que salva da falsa fé, produzida pelo coração humano, que conduz à perdição. A primeira marca é a falsa piedade. Observe que, segundo Jesus, muitos dirão naquele dia “Senhor, Senhor”. Talvez você não esteja familiarizado com esta expressão, mas no mundo semita quando se desejava enfatizar algo usava-se o recurso da repetição. Assim, no dia do juízo muitas pessoas se chegarão a Cristo mascaradas de uma falsa piedade, enfatizando o senhorio de Jesus sobre suas vidas, sem, contudo, o conhecerem de fato. Diante dos homens eram mui piedosas, mas estavam totalmente longe do reino de Deus.
A segunda marca se vê no apelo que fazem ao uso de dons. São pessoas que, no nome de Jesus, profetizaram, expeliram demônios, fizeram milagres, etc. Todavia, estavam perdidos, não conheciam, de fato, a Jesus. Conheciam o seu poder, mas não a sua graça. A fé salvífica não se confunde com o uso de dons espirituais; na verdade, os dons são apenas ferramentas que nos capacitam a servir a Deus no mundo e na igreja, mas nada tem a ver com nossa salvação ou espiritualidade.
Diante disto fica a questão: se é possível existir uma falsa piedade, que aos olhos humanos parece verdadeira, e se os dons não servem para indicar os filhos redimidos de Deus, como identificar os salvos? Observe o porquê da rejeição de Cristo a estes homens: “apartai-vos de mim, os que praticais a iniqüidade” (Mt 7.23). Apesar de demonstrarem piedade e poder, estas pessoas continuavam escravas do pecado, ou seja, não haviam nascido de novo, não sabiam o que era, de fato, ser regenerado.
Como se vê, aqueles supostos discípulos haviam experimentado algum tipo de fé, sem que esta pudesse salvá-los. Experimentaram dons do Espírito, sem que pertencessem a Cristo.
A advertência de Jesus a esta falsa segurança continua na parábola seguinte, onde dois homens construíram sua casa em terrenos diferentes, um sobre a rocha e outro sobre a areia. Aparentemente não se via diferença, mas no dia do julgamento o fundamento de cada casa foi revelado. Ambos ouviram a palavra da verdade, mas só um a praticou. Ambos criam estar seguros, mas só um se salvou da ruína.
O que leva, então, alguém a uma falsa convicção de salvação? No próximo estudo continuaremos examinando este aspecto, para que possamos fazer um juízo melhor de nossas próprias vidas e da fé que professamos em Jesus, para que não sejamos contados entre aqueles que do Senhor ouvirão, no dia do Juízo: apartai-vos de mim.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

PRESSUPOSTOS BÁSICOS PARA A CERTEZA DE SALVAÇÃO

Nenhuma doutrina surge do nada, ou é fruto de um juízo imparcial, à priori. Tudo o que declaramos crer resulta de pressupostos assumidos antes de qualquer investigação. Diante disto, podemos tomar duas atitudes: ou investigamos apenas para assegurar o que queremos crer, ou investigamos nossas crenças para averiguarmos se têm fundamento ou não, e aí, sim, tomarmos uma decisão pela verdade.
J. Kuerzinger (Dicionário de Teologia Bíblica, v.2. Ed.: Johannes B. Bauer. São Paulo: Edições Loyola. p.1037), nos lembra que “a discussão sobre a certeza da salvação depende essencialmente da compreensão que se tem da salvação cristã em geral.” Neste sentido, aqueles que advogam que a salvação é obra meritória do homem, resultado do seu suposto “livre-arbítrio”, negam a possibilidade do cristão ter certeza de sua salvação. O livre-arbítrio agiria de duas formas diferentes, dependendo do grupo a que se pertença: ou levando o homem à prática das boas-obras (geralmente reconhecidas como “caridade”), ou levando o homem a exercer a fé no salvador Jesus. Por causa disso, há uma divergência entre eles sobre a impossibilidade da certeza de salvação. Para uns (e.g. católicos-romanos), não se pode ter certeza da salvação porque não sabemos se já alcançamos a “quantidade” necessária de obras para sermos salvos. Na concepção católico-romana, a salvação resulta de uma “balança” equlibrada entre a obra de Cristo na cruz e as boas-obras dos homens. Assim, em algum momento estaremos salvos, mas como nossa maldade aflora constantemente, a certeza nunca é possível, pois não sabemos onde está o pêndulo.
Para outros (e.g. os pentecostais na sua grande maioria), não se pode ter certeza de salvação porque o suposto “livre-arbítrio” pode me fazer crer em Cristo num dia, e no outro me fazer negá-lo. Assim, o chamado à santidade no pentecostalismo se confunde com a salvação. Somente se santificando o homem poderia ser salvo. Novamente nos encontramos diante da “balança” proposta pela Igreja Católica, só que agora o peso de medida é outro, as obras de santificação e não a caridade. A idéia é simples: Cristo fez a parte dele na cruz, quebrou a maldição do pecado; cabe ao crente, agora, se santificar em obediência aos ensinos de Jesus. Quando o fiel alcança a medida da obra de Cristo sua salvação está garantida, porém, não permanentemente, pois o crente pode “cair da graça”, desequilibrar a balança e perder sua salvação.
É pressuposto deste artigo que a salvação, tal como se apresenta no Antigo e Novo Testamentos, é, primeiramente, uma obra de libertação do pecado e da morte, sob os quais toda a humanidade se encontra, oferecida graciosamente aos eleitos de Deus através da obra redentora de Jesus Cristo (Rm 3.23). Ponderemos detalhamente nestas afirmações:
• A salvação é uma obra de libertação do pecado e da morte. Pecado implica em rebeldia contra Deus, contra a Sua vontade manifestada em Sua Lei. Neste sentido, a Bíblia declara: “Não há quem faça o bem, não há nem um sequer” (Sl 14.3; Rm 3.9-18). Por causa disso, o homem sem Cristo ama o pecado, e não tem interesse nenhum pelo graça oferecida por Cristo (Jo 3.19). Como conseqüência, a Bíblia declara que este homem está morto espiritualmente (Ef 2.1), portanto, não pode desejar a vida, pois tudo o que conhece é a morte.
• Toda a humanidade se encontra debaixo do poder do pecado e da morte. A situação espiritual dos homens é igualitária, todos são filhos da desobediência (Ef 2.2), assim, não há ninguém capaz de praticar o bem por si mesmo. Tudo o que podem praticar é peculiar à sua natureza pecaminosa. Assim, como nenhum homem pode fazer o bem por sua própria vontade, mas apenas aquilo que é pertinente ao pecado, não existe livre-arbítrio, mas livre-agência, ou seja, a capacidade de se fazer tudo o que é pertinente à própria natureza.
• A salvação é oferecida, graciosamente, aos eleitos de Deus através da obra redentora de Cristo. Ou seja, somente os eleitos receberão os benefícios da obra redentora de Cristo (Rm 8.29,30; 2 Ts 2.13).
A primeira afirmação nos leva à segunda constatação bíblica, que a obra salvífica se torna efetiva por meio da vocação eficaz realizada pelo Espírito Santo de Deus. Com isto queremos dizer que há a necessidade do Espírito Santo chamar o eleito, mediante a pregação do evangelho, à salvação. Este chamado é eficaz porque cumpre o seu propósito na vida do eleito, pois ao conhecer a luz, manifesta em Cristo Jesus, ele deseja, ardentemente, entregar-se ao seu redentor, pois além de ter seus olhos abertos, tem o seu coração transformado; a Lei de Deus já não é insuportável para ele, antes pelo contrário, o seu prazer está em obedecer por ter sido redimido (1 Jo 2.4-6). “A menos que Deus, pelo seus Espírito, abra o coração do ouvinte, capacitando-o a crer, ele ou ela jamais poderá aceitar o convite do evangelho.” (Anthony Hoekema, Salvos pela Graça,Cultura Cristã, p.88).
Este chamado regenera o coração do pecador, levando-o à conversão por meio da fé, a qual lhe assegura os benefícios da cruz do Calvário conquistados por Jesus. A fé, neste sentido, não é um exercício de algum livre-arbítrio próprio do homem, mas um dom concedido por Deus na regeneração. Somos salvos pela graça, mediante a fé, diz o apóstolo Paulo (Ef 2.8), mas observe que ele diz que isto, tanto a graça quanto a fé (em grego temos o pronome demonstrativo touto, no gênero neutro, o qual se aplica tanto à graça quanto à fé neste texto), não vem de vós, é dom de Deus. Assim, a salvação torna-se uma realidade fundamental nesta vida, pois nos foi outorgada pelo próprio Deus. Por isso a Escritura chama Jesus de “autor e consumador” da nossa fé (Hb 12.2). Todavia, é na volta do nosso Senhor Jesus que a salvação recebe sua plena consumação.
Como esperamos ter delineado acima, é pressuposto básico deste trabalho que a salvação nos é garantida única e exclusivamente pela obra graciosa de Deus em Jesus, a qual é recebida pela fé e não por nossos méritos ou esforços, quer sejam de caridade ou atos de fé.
Entendido isto, podemos, então, explorar a doutrina da certeza da salvação. Todavia, caso você não concorde com esta exposição resumida da obra da salvação, dificilmente você entenderá e aceitará o fato de que o crente, ainda que possa vir a pecar, pode ter certeza de sua salvação e, assim, ser guiado pelo Espírito Santo de volta ao Pai que o escolheu e chamou em Jesus para a vida eterna.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

CERTEZA DE SALVAÇÃO - Introdução

CERTEZA DE SALVAÇÃO
A realidade evangélica brasileira padece de um grande mal teológico medieval, o da incerteza quanto a sua posição no Reino de Deus. Os cristãos de nossa geração experimentam um tipo de fé que produz medo e frustrações. Uma fé que não assegura verdades eternas para aqueles que a possuem.
Como conseqüência disto, vemos crentes enfermos espiritualmente, estagnados no processo de santificação, de crescimento no relacionamento com o Senhor, e até mesmo indispostos a amadurecer.
Isto tem se estabelecido em nosso meio de uma forma avassaladora, visto que a conversão tem sido mal ensinada e mal compreendida em nossas igrejas. O que observamos é um ensino que se fundamenta nas obras meritórias do fiel, numa série de regras que devem ser guardadas e sem as quais o mesmo estaria condenado.
Por mais que neguemos tal aspecto, e atribuamos a Cristo a nossa salvação, esta não é vista de fato como um descanso de fé na obra que Ele realizou na cruz do calvário pelos seus. A salvação, no inconsciente de uma boa parte dos cristãos, repousa em Cristo, mas não naquilo que Ele realizou no Calvário, mas naquilo que Ele ensinou.
Esta visão nos leva ao cerne do problema soteriológico do gnosticismo tal como se apresenta no século II, onde a salvação oferecida por Cristo recaía nos seus ensinos e aqueles que obtivessem o conhecimento (gnosis) do mesmo e lhe observasse seriam salvos.
O catolicismo medieval cometeu um erro similar ao negar a possibilidade da certeza da salvação por confundi-la com a santificação. Apesar de aceitar o sacrifício de Jesus na cruz, a Igreja negava a possibilidade de termos a certeza de que aquele ato nos incluía e nos livrava da condenação. Anthony Hoekema cita alguns parágrafos dos Cânones e Decretos do Concílio de Trento onde se diz:
Ninguém sabe com a certeza da fé, que não pode estar sujeita a erro, que obteve a graça de Deus.
Ninguém, enquanto está nesta vida mortal, pode presumir, com respeito à divina predestinação, que pode determinar por certo que está entre os números dos predestinados... exceto por revelação especial, não se pode saber quem Deus escolheu para si mesmo. Se alguém diz que um homem, nascido de novo e justificado, é obrigado
pela fé a crer que tem lugar assegurado no número dos predestinados: seja anátema.
Assim, a salvação se torna um esforço humano em observar os ensinos de Jesus sem que se possa ter a certeza de já a ter alcançado. Como resultado deste esforço temos o cansaço espiritual e, em uma boa parte dos casos, a frustração.
Este é o mesmo quadro que se desvenda no cenário evangélico brasileiro onde o legalismo é sinônimo de meio para a salvação. Daí porque termos tantos cristãos desfalecidos em sua caminhada e tantos outros estagnados no crescimento espiritual.
Possuir a certeza de salvação é de suma importância para o progresso espiritual. Como alerta o Dr. R.C. Sproul,
Talvez nada seja mais importante para acelerar nosso crescimento cristão do que uma correta e sólida convicção da salvação. Quando duvidamos acerca de nossa condição no Reino, tornamo-nos vulneráveis aos dardos flamejantes de Satanás. Somos como junco balançando ao sabor do vento. Tornamo-nos como cortiça no oceano, sendo sacudidos a cada mudança da maré.
A estabilidade é a marca do cristão maduro. Tal estabilidade não é possível, contudo, se o próprio alicerce do crente não for sólido. Casas estáveis repousam sobre fundações estáveis.
É com esta preocupação pastoral que desejamos expor a doutrina da certeza de salvação, fundamento essencial para o desenvolvimento de nossa fé.

SÉRIE "ESTUDOS BÍBLICOS"

Amados irmãos e irmãs, é com grande alegria que hoje iniciamos uma série de estudos teológicos através deste blog. Quero agradecer o incentivo que tenho recebido de minha esposa nesta tarefa, bem como as palavras estimulantes da irmã Miriam Simões para que isto acontecesse. Aproveito para externar minha gratidão pública à ela e seu esposo, Presbítero Sérgio Simões, pelo apoio, conforto e exortações em minha caminhada de restauração pessoal. Que o Senhor Deus os cubra de bênçãos sempre e a toda a sua casa (Regina, Eduardo e Luis Paulo).
Considerando toda a minha caminhada de restauração pessoal no ano passado, entre muitas lágrimas e dores que me foram impostas por Deus, disciplinando-me para moldar meu coração à sua vontade, creio que o tema desta primeira série seja oportuno, pois foi a certeza de minha salvação, em Jesus Cristo, que me fez andar seguro, ainda que em meio a extremo sofrimento. Não foram poucas as lágrimas, mas a certeza de que tudo aquilo era porque Deus me amava, me havia escolhido comO seu filho e havia me dado a salvação, em Jesus, era algo renovador em minha alma. Assim, compartilho com os irmãos e irmãs mais do que reflexões teológicas; compartilho a certeza que me fez caminhar em silêncio, aceitando toda a ira de Deus, na certeza de ser filho redimido e salvo por Jesus. Hoje, colho os frutos desta bênção.
Que o Senhor Deus te abençoe ricamente no estudo desta doutrina maravilhosa que a Bíblia nos ensina.
A todos os irmãos e irmãs da Igreja Presbiteriana de Cruz das Almas (Tietê/SP), que oraram, e ainda oram por mim, minha gratidão, e recebam estes estudos como uma oferta a vocês também pelo tanto que pude aprender caminhando convosco.