sexta-feira, 29 de outubro de 2010

AMAR É UMA DECISÃO

Nesta semana eu e minha esposa tivemos algumas dificuldades de comunicação. E sempre que isto acontece, o relacionamento afetivo é diretamente atingido. Pois bem, foi no meio desta situação que minha esposa me presenteou com o texto abaixo, que ela achou na internet, e que agora compartilho com você. Para minha vida e para a de minha esposa, esta concepção bíblica do amor tem sido muito útil no fortalecimento de nossa aliança com Deus, por isso nos lembramos constantemente desta verdade. Uma boa leitura para você.
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AMAR É UMA DECISÃO

Uma das afirmações mais controversas hoje em dia é essa: "Amar é uma decisão". É uma frase que lembra que os casais devem amar a pessoa e não o comportamento dela.
Muitas pessoas não compreendem porque precisamos decidir amar já que elas já tomaram uma decisão anos atrás quando casaram.
Na vida de casados é normal termos períodos de romance e desilusão. Este ciclo se repete, às vezes por dias, semanas ou mesmo meses.
Uma maneira de acabar com a desilusão é decidindo amar. Os sentimentos mudam e nem sempre podem ser controlados. Amar não é somente um sentimento, é mais que um sentimento. Amar é uma decisão.
Amar é uma decisão de estar aberto e compartilhar, quando não temos vontade de fazê-lo. Amar é uma decisão quando você acha que seu cônjuge não merece seu amor.
Amar é uma decisão e quer dizer que você está aberto a uma comunicação honesta com seu cônjuge. E isso não quer dizer somente falar, mas ouvir. É também decidir ser amado.
Tomar a decisão de amar inclui o dia-a-dia, nas pequenas coisas que vocês fazem um pelo outro, especialmente quando você sente que não está amando. A partir da decisão de amar, sempre segue o sentimento do amor.
A decisão de amar é tomada todos os dias. O que foi feito ontem não conta. É preciso recomeçar sempre.
Gary Smalley no seu livro "Love is a Decision" diz:
"Existe um plano para um casamento profundo, quente e excitante. Plano? - Você pergunta - Exatamente! Os casamentos não ocorrem por acidente.
Os seis elementos para manter o amor são:
1. Fazer seu cônjuge sentir-se realmente honrado por você;
2. Aprender a arte do toque - gentilmente
3. Manter vivo o cortejar em seu casamento
4. Reabrir o coração fechado pela raiva
5. Construir - ou reconstruir - a confiança na relação
6. Tornar-se o melhor amigo dele ou dela.
Esses seis elementos são a chave para o amor. Amar não é uma emoção, amar não é um sentimento, amar não acontece uma só vez. Amar é uma decisão. Amar é acordar todos os dias comprometido em honrar seu conjuge ao colocar em prática as seis chaves. Se você quer ter um grande relacionamento, adivinhe, depende de você".
Que você decida amar, hoje e todos os dias daqui para frente. O passado fica para trás.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

DÍZIMO NO NOVO TESTAMENTO? QUE HERESIA É ESTA?

Durante as minhas férias de junho de 2010 me deparei com um texto publicado no blog “Bereianos” (www.bereianos.blogspot.com), o qual já fora publicado em outro, “Voltemos ao Evangelho”, em que o articulista defendia que o dízimo não era uma prática neotestamentária. Após ler, decidi postar um comentário, o qual foi censurado e, consequentemente, não publicado no blog. Decidi, então, que escreveria meu comentário em um artigo para o meu próprio blog. Infelizmente, os muitos compromissos (tradução de livros, a publicação do meu segundo livro pela Fonte Editorial, agenda de aconselhamento pastoral, aulas de teologia e etc.) me impediram de fazê-lo em tempo mais hábil. Mas eis que agora, com o tempo um pouco folgado, decidi escrever este artigo.
Já de algum tempo tenho ouvido e lido argumentos que dão conta de que o dízimo seria uma prática do Antigo Testamento, da “velha aliança”, do tempo da “lei”, e que tal teria sido abolido pela “graça”, não havendo respaldo no Novo Testamento para o mesmo.
Diante disto, comecei a me perguntar o por que desta rejeição a uma prática tão antiga na vida da igreja cristã. E quando falo antiga, me refiro aos primórdios do cristianismo. Sei que haverá quem objete dizendo que o cristianismo primitivo não tinha tal prática, mas isto não é verdade. Para defender esta tese, os proponentes manipulam exegeticamente dois textos neotestamentários (como procurarei demonstrar mais à frente), a saber, Mateus 23.23 e Lucas 11.42, e selecionam extratos convenientes dos pais da igreja a fim de passar pseudo-erudição aos seus argumentos. Não é proposta deste artigo examinar os pais da igreja, mas prometo um outro artigo mostrando que a prática do dízimo era comum igreja pós-apostólica.
Enquanto pensava sobre a razão desta onda de reação contrária ao dízimo só pude observar duas razões para a mesma. A primeira, diz respeito a cristãos sinceros, que estão cansados com os abusos e exploração financeira que algumas igrejas/seitas praticam (e.g. Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Mundial do Poder de Deus, Renascer em Cristo, e afins), e alguns pregadores, em particular, para manter seus programas televisos megalomaníacos (e.g. Silas Malafaia). Contra estas práticas, irmãos sinceros, tementes a Deus, rejeitaram tais ensinos, mas por lhes faltar preparo exegético, passaram a interpretar os textos bíblicos não à luz da sua mensagem, mas à luz de suas revoltas contra os abusos. Daí, acabaram por jogar fora uma prática tão salutar e saudável da espiritualidade cristã.
A segunda razão para rejeição do ensino do dízimo encontrei nos corações avarentos, que amam o dinheiro e que, em nome da piedade, passaram a criar pseudo-exegeses para acalentar os seus corações pecaminosos, pois dão ao reino de Deus aquilo que é conveniente ao seu bolso. Espero que esta não seja a sua situação, que lê este artigo e que é contra o dízimo.
Pois bem, antes que partam para uma ataque ad hominem, permita-me dizer-lhe que sou pastor. Alguns, a partir de agora, dirão que sou suspeito para falar do assunto, pois advogaria em causa própria. Considero este tipo de argumento muito medíocre, pois o assunto não trata da nossa função, ou cargos ou qualquer outra coisa ligada à posição que ocupamos na igreja, mas de questões hermenêuticas que nos permitam o entendimento correto de passagens bíblicas.
Outra coisa que gostaria de registrar contra o argumento ad hominem é que durante toda a minha vida fui dizimista e defensor desta causa. Porém, nos anos de 2007 e 2008 fiquei sem pastorear por questões pessoais, e mesmo assim, continuei dizimista na igreja onde passei a congregar. Por fim, voltei a pastorear em 2009, e sirvo a Igreja Episcopal Carismática do Brasil, sem receber nenhum tipo de salário (por opção, enquanto foco esforços na implantação da Igreja em Brasília), e continuo dizimista de tudo o que recebo (como tradutor e revisor de livros para editoras evangélicas, como professor de teologia, como autor de livros, etc). Espero que estes pontos sejam suficientes para calar os que tentarem me acusar de defender o dízimo em causa própria.
Tendo estabelecido estas questões, proponho focar minha atenção na suposta análise exegética que encontrei no artigo supra citado no blog dos “bereianos”. O mesmo tomava o texto de Mateus 23.23 para dizer que o mesmo não fundamentava a prática do dízimo no Novo Testamento, mas que falava de uma prática da “antiga aliança”. Segundo o articulista (não lembro o nome, a única coisa que guardei na memória é que se trata de alguém desconhecido no meio teológico), Jesus teria ensinado a prática do dízimo, nesta passagem, porque estava falando com fariseus e, portanto, como uma prática válida para a “antiga aliança” que estava em jogo. Ainda, segundo o articulista, a “antiga aliança” teria acabado com a morte de Jesus, dando início à nova aliança, o tempo da graça.
Confesso que ao ler isto fiquei estarrecido, pois nunca vi tamanha incompetência hermenêutica como neste caso. Os princípios mais básicos de interpretação textual foram jogados no lixo pelo argumento desta pessoa. Foi por isso que decidi postar um comentário, pontuando aquilo que via de errado no argumento e fiquei decepcionado pela censura. Pois bem, vamos aos princípios negligenciados pelo autor.
O primeiro princípio hermenêutico postulado por todos os teólogos conservadores (em oposição aos liberais e as hermenêuticas pós-modernas), é que a mensagem de um texto deve ser encontrada no eixo autor-comunidade primária. Aqui se encontra o primeiro erro daquele articulista, pois ele leu as palavras de Mateus 23.23 sob o eixo das personagens da narrativa-discurso, a saber, Jesus-fariseus. Aplicando o princípio hermenêutico, aqui, o texto deveria ser lido na perspectiva Mateus (autor do Evangelho)-comunidade mateana (a quem ele se dirige). Neste sentido, as palavras devem ser entendidas sob a ótica do autor, Mateus, que querendo das instruções à sua comunidade sob várias questões ligadas à nova vida dos convertidos (Mateus 28.20, onde “ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado” se refere aos ensinamentos contidos no Evangelho do próprio Mateus, como veremos mais adiante), selecionou a cena em que Jesus ensinava aos seus discípulos sobre o que deveriam observar a fim de instruir sua comunidade, que era muito posterior à data da narrativa-discurso.
Permita-me ser mais claro. O articulista a quem critico tomou a narrativa-discurso para afirmar que Jesus havia instruído o dízimo ainda debaixo da “velha aliança”. Posso concordar com ele neste ponto, mas narrativa, em si, foi escrita depois, já debaixo da “nova aliança”. Quando que Mateus escreveu o seu evangelho? O debate acadêmico é grande sobre este ponto. Temos data de 50 à 70 depois de Cristo (há uns liberais que insistem com datas por volta de 90 à 110 depois de Cristo, mas, hoje, estas teses estão em descrédito na pesquisa acadêmica). Seja qual for a data (creio que possamos data em torno de 50 d.C.), todas elas apontam para o fato de que as palavras de Mateus 23.23 foram escritas já no tempo da “nova aliança”, visando instruir a comunidade a que se destina (que chamamos, tecnicamente, de “mateana”) sobre temas judaicos válidos para a igreja cristã, neste caso específico de Mateus 23.23, sobre o dízimo (falaremos mais disto no próximo ponto).
Creio que estas observações, acima, tenham sido suficientes para você, leitor, perceber o erro crasso cometido pelo articulista ao tentar descaracterizar o dízimo como observância da “nova aliança”. E espero ter demonstrado como devemos ler um texto na perspectiva autor-comunidade primária.
O segundo princípio hermenêutico básico diz que um texto deve ser lido à luz do seu contexto e, nunca, à luz de suas frases. Pois bem, este foi o segundo erro cometido pelo articulista. Ele isolou o versículo 23, criou um contexto imaginário de “velha aliança” versus “nova aliança” e desenvolveu uma argumentação falaciosa.
Mas antes de prosseguirmos na refutação, convém esclarecer o que se entende, em hermenêutica textual por “contexto”. Infelizmente, muita gente entende que contexto era o que vinha sendo dito antes, e assim, limitam o contexto às palavras imediatamente anteriores e posteriores. Isto é outro erro crasso, pois o contexto refere-se à todo o discurso que antecede a passagem que se quer analisar e as palavras que a seguem, dando-lhes sentido. Assim, por contexto temos que entender a mensagem do livro como um todo (contexto geral) até o momento da passagem em análise à luz do seu bloco discursivo (contexto específico).
Aplicando este princípio em Mateus, temos que o texto foi elaborado tendo 5 grandes discursos (5.1-7.27, 10.1-42, 13.1-52, 18.1-35 e 24.1-25.46) como sua estrutura fundamental. No fim de cada discurso aparece, em grego, sempre a mesma frase, kai egeneto hote etelesen ho Iesous, que significa, literalmente, “e aconteceu que disse Jessus..., o que indica marcação de discurso no Evangelho de Mateus, como muitos exegetas têm mostrado historicamente. Agora, chama a atenção que em Mateus 28.20 diga que na missão da igreja, “fazei discípulos”, esteja incluído o ensinara “todas as coisas que vos tenho ordenado”. Por que isto chama a atenção? Porque em 26.1, quando termina o quinto bloco discursivo de Mateus, se diz: kai egeneto hote etelesen ho Iesous panta tous logous, que literalmente significa: “e aconteceu que disse Jesus todas estas palavras/instruções”. Diante do exposto, segue que, do ponto de vista estrutural da mensagem do Evangelho, o mesmo deveria ser lido à luz dos 5 blocos discursivos. E do que tratam estes blocos:
5.1-7.27: O cristão e a lei de Deus
10.1-42: O cristão e o compromisso missionário
13.1-52: O cristão e o reino de Deus
18.1-35: O cristão e a vida em comunidade
24.1-25-46: O cristão e o juízo de Deus

Uma série de questões hermenêuticas poderia ser levantada aqui, mas queremos nos ater à passagem de Mateus 23.23. Como se pode ver, a mesma está entre os discursos catequéticos de 18.1-35 e 24.1-25.46, a vida em comunidade e o juízo de Deus. Tem sido observado por vários comentaristas que os blocos narrativos-discursivos que se colocam entre os blocos discursivos de Mateus servem para ilustrar o discurso anterior e preparar o novo discurso. Como exemplo, peguemos o nosso caso específico. O bloco de 18.1-35, que fala da vida em comunidade, fala em cuidar dos pequeninos e perdoar aos que nos ofendem. A primeira narrativa que segue a estas instruções é a questão do divórcio, onde o discurso se aplica em um caso específico. Já a ultima narrativa-discurso do bloco, 23.37-39 fala da oração de lamento e anúncio de juízo de Deus sobre Jerusalém. Então, começa o Sermão Profético (ou Escatológico, como alguns comentaristas prefere chamar). Creio que você tenha percebido a função destes blocos intermediários.
A nossa passagem pertence ao bloco intermediário que aponta para os exemplos da vida em comunidade e o juízo de Deus sobre a mesma. E de uma forma mais especifica, ainda, Mateus 23.23 se insere na narrativa-discurso que tem início no capítulo 23.1. O que caracteriza este bloco? Considerando que o ensinamento de Jesus sobre a comunidade cristã difere, em muito, do modelo farisaico, o que dizer do mesmo? Rejeitá-lo totalmente?
Observe que após identificar a si mesmo como o próprio Messias que os fariseus esperavam (22.41-45), o que lhe dava autoridade suprema naquilo que instruía, Jesus se volta para as multidões e os seus discípulos e lhes ensina que isto não significava desprezar o ensinamento dos fariseus, pois segundo Jesus, “Na cadeira de Moisés sentaram-se os escribas e fariseus”. O que isto significa? Que eles eram intérpretes legítimos da Lei de Deus. Por isso, Jesus continua, “Praticai o que vos ordenarem”, o que se entende por serem eles (os fariseus), legítimos intérpretes. Porém, as multidões e os discípulos não deveriam imitar as suas obras, “pois dizem e não cumprem”. A partir deste momento, Cristo denuncia algumas de suas práticas (v.4-7); em seguida, passa a combater o mal que leva a hipocrisia, a soberba do coração, exortando a se sujeitarem ao Messias (v.8-12). Tendo dito isto, Jesus passa a ilustrar o que dissera sobre os fariseus: que devemos observar o que eles ensinam, mas que não deveríamos imitá-los em suas obras (v.13-35)
São sete ensinos, marcados por ouai, traduzido por “Ai”. Estes “Ai” são extraídos dos oráculos proféticos do Antigo Testamento que visavam anunciar o castigo de Deus sobre comportamentos pecaminosos. É dentro deste eixo “façam o que eles dizem, mas não façam o que eles fazem” e o sinal de castigo pelo comportamento errado que encontramos o “Ai” sobre o dízimo.
O que Jesus ensinou? O texto é muito claro, e o articulista a quem critico entendeu isto: Jesus estava validando o ensino dos fariseus sobre o dízimo, mas estava desautorizando a prática deles, pois davam o dízimo de tudo, mas desconsideravam coisas básicas que deveriam acompanhar a oferta: a justiça, a misericórdia e a lealdade. Os fariseus ensinavam que o dízimo era bíblico, mas entendiam que sua prática era suficiente para alcançar as bênçãos de Deus (algo parecido com o que se vê, hoje, nos discursos de Edir Macedo e companhia de falsos profetas), desprezando as coisas que deveriam acompanhar a prática do dízimo, justiça, misericórdia e lealdade. Após criticar esta atitude, Cristo termina dizendo: “devíeis, porém, fazer estas coisas (justiça, misericórdia e lealdade), sem omitir aquelas (o dízimo do que fora mencionado).
Agora, aplicando o primeiro princípio hermenêutico delineado acima, a quem se destina este bloco? Aos fariseus? Aos discípulos que estavam com Jesus no momento da fala? À multidão? É claro que não. Se o texto só foi escrito depois de 50 d.C., é óbvio que o mesmo visava instruir leitores, muito tempo depois do ocorrido, sobre a questão do dízimo. Assim, ao preservar esta narrativa-discurso de Jesus, Mateus procurava mostrar à igreja cristã que o dízimo não deveria ser desprezado. E que, portanto, era uma prática para os cristãos da “nova aliança” também.
O mesmo exercício hermenêutico que apliquei aqui, pode ser aplicado em Lucas, também. Agora, em Lucas tem um agravante: a comunidade, como a maioria dos estudiosos do Novo Testamento tem demonstrado, era composta de gentios, oriundos de classes sociais baixas (como exemplo, verifique o material narrativo que é peculiar a Lucas, e você verá que se trata de gente pobre ou excluída da sociedade). Assim, este Evangelho estaria ensinando, assim como Mateus, a prática do dízimo a esta comunidade gentílica também.
Outro erro hermenêutico do artigo em questão se observa quando perguntamos: em que momento o texto de Mateus demonstrou debater o tema da “velha aliança” versus “nova aliança”? Um terceiro princípio básico de hermenêutica ensina que a mensagem extraída de uma parte deve ser avaliada à luz do todo. Vale lembrar que no primeiro bloco discursivo, o “Sermão do Monte”, caps.5-7.27, Jesus se coloca na direção contrária a esta antítese, Lei x Graça. Após descrever o caráter do seu discípulo nas bem-aventuranças e falar do impacto deste no mundo (sal e luz), o Senhor mostra que este caráter impactante é vivido somente por meio da observância da Lei de Deus, e não da sua rejeição, “Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim para revogar, vim para cumprir” (5.17). Em seguida, ele diz que isto não é apenas a tarefa dele, Jesus, enquanto Messias, mas uma obrigação para os seus discípulos que gozam do seu caráter: “Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder a dos escribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus” (5.20). O que é exceder a justiça dos escribas e fariseus? Nas perícopes seguintes, o Senhor exemplifica tomando a Lei e ampliando a sua implicação.
Este procedimento, de tomar a Lei e ampliar as sua implicações para os discípulos, se pode ver em várias outras passagens do Evangelho de Mateus, exemplificando constantemente o que fora dito em 5.20. Então, quando chegamos em 23.23, fica claro que esta dinâmica redacional continua. A Lei ensina a entrega do dízimo. Como o discípulo “excede” a justiça dos escribas e fariseus? Dando além do dízimo? Não. O texto é claro: “devíeis, porém, fazer estas coisas, sem omitir aquelas!” O discípulo “excede” ao observar não somente o dízimo, mas também “a justiça, a misericórdia e a lealdade” (tradução Peregrino, Paulus). Ou seja, à luz de Mateus, esta antítese “velha aliança” e “nova aliança”, enquanto desobrigação da Lei, não existe.
Que conclusão podemos tirar deste artigo infeliz sobre o dízimo no Novo Testamento? Que ele é um desserviço aos que amam a Cristo e sua Igreja, pois lhes priva de uma bênção chamada dízimo, não como algo que se dá a Deus para se auferir benefícios, mas sinal de gratidão por tudo o que ele tem nos dado.
Gostaria de terminar fazendo mais duas ressalvas. Primeira, durante o artigo mencionei a frase “os estudiosos do Novo Testamento”, ou “vários estudiosos”, e frases afins. Às vezes, as pessoas esquecem do cerne do problema e ficam procurando desculpas diante da confrontação de suas ideias. Assim, para que não venham críticas tolas dizendo que mencionei “estudiosos” sem citar nenhum, lembro que este artigo não pretende ser um comunicado acadêmico, mas uma reflexão a partir do que, academicamente, tem se mostrado sobre o Evangelho de Mateus. Para os que desejarem estudar o que disse, recomendo as obras de Carson, Borkhann, Tasker, Hendricksen, Stott, Broadus, Kümel, Gundry, e tantos outros que escreveram sobre o Evangelho de Mateus ou em introduções ao Novo Testamento ou em comentários específicos. Se você é estudante de teologia ou teólogo, saberá que citei autores conservadores e liberais. Fiz isto não porque seja simpatizante da teologia liberal, antes pelo contrário, sou um ferrenho combatente da mesma; o fiz para frisar que minha análise de Mateus encontra respaldo de todos os lados quanto à relação autor-comunidade. Caso queiram uma bibliografia em inglês, ou detalhada destes autores, peço que me enviem um e-mail e responderei.
A segunda ressalva é que admiro o trabalho que os irmãos do blog “bereianos” desenvolvem em defesa do evangelho do Senhor Jesus contra a apostasia geral da Igreja. Porém, não posso aceitar que nossos ressentimentos contra a apostasia acabe nos afastando de verdades bíblicas simplesmente porque outros as estão adulterando.
Que o Senhor da Igreja nos faça caminhar na verdade e nos livre de qualquer distorção da sua santa Palavra.
Pastor Airton Williams

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

O LEGADO DE CHARLES FINNEY

Recentemente, em minhas aulas sobre o "Ser de Deus", surgiram algumas questões concernentes a Charles Finney e sua influência negativa na teologia cristã. Fiz algumas ponderações a partir do texto abaixo, e por isso decidi postá-lo, a fim de que seja útil para mais pessoas. Boa leitura.
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Editora Fiel
O Legado de Charles Finney
Por Michael S. Horton

Jerry Falwell descreveu Finney como “um de meus heróis e de muitos evangélicos, incluindo Billy Graham”. Lembro-me de ter
visitado o Instituto Billy Graham alguns anos atrás; ali observei o lugar de honra dado a Finney na tradição evangélica. Isto foi
reforçado pela recordação de minha primeira aula de teologia em uma faculdade evangélica, na qual foi solicitado que lêssemos a
obra de Finney. O avivalista de Nova Iorque tem sido freqüentemente citado e celebrado, como um herói, pelo famoso cantor
evangélico Keith Green e pela organização Jovens com uma Missão. Finney é particular-mente estimado entre líderes de
movimentos evangélicos conserva-dores e liberais, tanto por Jerry Falwell quanto por Jim Wallis (da revista Sojourner). E sua
marca pode ser vista em vários movimentos que parecem ter posições diferentes, mas que na realidade são herdeiros do legado
de Finney. Para grupos tais como o movimento Vineyard e o de Crescimento de Igrejas, em campanhas políticas e sociais, no
televangelismo e no movimento Pro- mise-Keepers (Guardiões da Promessa), “Finney continua vivo!”, citando as palavras de um
dos presidentes do Wheaton College.
Isso acontece porque o impulso moralista de Finney idealizou uma igreja que, em grande escala, seria um agente de reforma da
sociedade e do indivíduo, ao invés de uma instituição onde os meios da graça, a Palavra de Deus e as ordenanças, são colocados
à disposição dos crentes que, em seguida, levam o evangelho ao mundo. No século XIX, o movimento evangélico identificou-se, de
maneira crescente, com as causas políticas – a abolição da escravatura, leis sobre o trabalho infantil, os direitos da mulher e a
proibição de bebidas alcoólicas. Na virada do século, com a afluência de imigrantes católicos romanos, o que deixou apreensivos
muitos protestantes americanos, o secularismo começou a minorar a influência do movimento evangélico sobre instituições
(universidades, hospitais, organizações filantrópicas) que os crentes haviam criado e mantido. Em um desesperado esforço para
reconquistar este poder institucional e a glória da “América Cristã” (um ideal que sempre tem dominado a imaginação de alguns,
mas, após a desintegração da Nova Inglaterra Puritana, se tornou ilusório), o protestantismo da virada do século lançou
campanhas para “americanizar” imigrantes, enfatizando o ensino de valores morais e a “educação do caráter”. Os evangelistas
modelaram seu evangelho em termos de utilidade prática ao indivíduo e à nação.
Este é o motivo por que Finney é tão popular. Ele foi grandemente responsável pela mudança da ortodoxia reformada, evidente no
Grande Avivamento (nos ministérios de Edwards e Whitefield), para o avivalismo arminiano (na realidade, também pelagiano),
evidente desde o Segundo Grande Avivamento até ao presente. Para demonstrar a divide do evangelicalismo moderno para com
Finney, temos de inicialmente observar seus desvios teológicos. Com base nestes desvios, ele tornou-se o pai de alguns dos
grandes desafios contemporâneos dentro das próprias igrejas evangélicas, ou seja, o Movimento de Crescimento de Igrejas, o
Pentecostalismo e o Avivalismo Político.
Quem era Charles Finney?
Reagindo contra o calvinismo do Grande Avivamento, os sucessores daquele grande movimento do Espírito afastaram-se do
caminho do Senhor e seguiram o dos homens, apartaram-se da pregação de conteúdo objetivo (ou seja, Cristo crucificado) para
seguir a ênfase de levar as pessoas a “fazerem uma decisão”.
Charles Finney (1792-1875) ministrou nos rastros do “Segundo Avivamento”, conforme esse tem sido chamado. Era um advogado
e membro da igreja presbiteriana; em certo dia, experimentou “um poderoso batismo do Espírito Santo”, que, “à semelhança de
uma onda de energia”, ele relatou, “percorreu todo meu ser, parecendo vir em ondas de amor líquido”. Na manhã seguinte, ele
informou ao seu primeiro cliente: “Não posso mais defender sua causa; tenho um chamado para defender a causa do Senhor
Jesus”. Recusando-se a assistir aulas no Seminário Princeton (ou qualquer outro seminário), Finney começou a promover
avivamentos na parte norte do Estado de Nova Iorque. Um de seus mais populares sermões era “Os Pecadores Estão Obrigados a
Mudar Seus Próprios Corações”.
Ao considerar qualquer assunto a ser ensinado, esta era a pergunta fundamental de Finney: “Isto é bom para converter
pecadores?” Um dos resultados do avivalismo de Finney foi a divisão dos presbiterianos dos Estados de Filadélfia e de Nova
Iorque em facções calvinistas e arminianas. As “Novas Medidas” de Finney incluíam o “banco dos ansiosos” (precursor do atual
apelo para “vir à frente”), táticas emocionais, que levavam as pessoas a sentirem-se desesperadas e chorarem, e outros
“incentivos”, como ele e seus seguidores os chamavam. Finney se tornou mais e mais hostil ao presbiterianismo, referindo-se de
maneira crítica na introdução de sua obra “Teologia Sistemática” à Confissão de Westminster e a seus elaboradores, como se eles
tivessem criado “um periódico papal” e elevado sua Confissão e Catecismo ao trono do papae ao lugar do Espírito Santo”. De
maneira notável, Finney demonstra quão profundamente o avivalismo arminiano, por causa de seu apelo aos sentimentos naturais,
tende a ser uma forma polida de liberalismo teológico, visto que ambos se renderam ao Iluminismo e seu culto do entendimento e
da moralidade humana:
“O fato de que a Confissão elaborada pela Assembléia de Westminster seria reconhecida no século XIX como um padrão para a
igreja ou para um grupo específico dela não é apenas surpreendente, mas também (tenho de afirmar) é bastante ridículo. É tão
ridículo na teologia quanto o seria em qualquer outra ciência. É melhor ter um papa vivo do que um morto”.
O que estava errado na teologia de Finney?
Não precisamos ir além do índice de sua Teologia Sistemática para reconhecer que toda a teologia de Finney girava em torno da
moralidade humana. Os capítulos 1 a 5 falam sobre o governo, a obrigação e a unidade de ação moral. Os capítulos 6 e 7
Editora Fiel http://www.editorafiel.com.br/artigos_print.php?id=42
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referem-se à “Obediência Completa”; os capítulos 8 a 14 discursam sobre o amor, o egoísmo, virtudes e pecados em geral.
Somente no capítulo 21, o leitor acha alguma coisa especificamente cristã, reportando-se à expiação. A este capítulo segue um
discurso sobre a regeneração, o arrependimento e a fé. Existe um capítulo sobre a justificação acompanhado por seis sobre a
santificação. Em outras palavras, Finney realmente não escreveu uma Teologia Sistemática, e sim uma coletânea de ensaios a
respeito de moralidade.
Entretanto, não estamos afirmando que a obra de Finney não possui algumas declarações teológicas significativas.
Respondendo à pergunta: “O crente deixa de ser crente sempre que comete um pecado?”, Finney disse:
“Sempre que comete pecado, o crente deixa de ser santo. Isto é evidente. Sempre que peca, ele precisa ser condenado; tem de
incorrer na penalidade da lei de Deus. Se alguém disser que o preceito da lei ainda vigora, mas que, no caso do crente, a
penalidade foi anulada para sempre, eu respondo afirmando que anular a penalidade da lei é cancelar seu preceito, pois, se o
preceito não demanda punição, não existe lei, e sim apenas uma advertência ou conselho. Por conseguinte, o crente é justificado
em proporção à sua obediência e precisa ser condenado, quando pecar; de outra forma, o antinomianismo se torna verdadeiro...
Neste sentido, o crente que peca e o incrédulo encontram-se exatamente na mesma situação”.
Finney acreditava que Deus exige perfeição absoluta, mas, ao invés de levar as pessoas a buscarem a perfeita justiça em Cristo,
ele concluiu que:
“...a plena obediência no presente é a condição da justificação. Porém, quanto à pergunta: o homem pode ser justificado enquanto
o pecado permanece nele?, respondemos: é certo que não, quer seja com base em princípios da lei ou do evangelho, a menos
que a lei seja anulada. Ele pode ser perdoado, aceito e justificado, no sentido evangélico, enquanto o pecado, em qualquer grau,
permanece nele? Absolutamente, não".
Posteriormente falaremos mais sobre a doutrina da justificação ensinada por Finney, mas agora já podemos ressaltar que ela está
fundamentada sobre a negação da doutrina do pecado original. Afirmado tanto por católicos quanto por evangélicos, este ensino
bíblico repete com insistência que todos somos nascidos em pecado e herdamos a corrupção e a culpa de Adão. Estamos,
portanto, em escravidão a uma natureza pecaminosa. Conforme alguém disse: “Nós pecamos porque somos pecadores”; a
condição de pecado determina nossos atos pecaminosos, e não vice-versa. Finney, entretanto, seguiu os ensinos de Pelágio, o
herege do quinto século, que, por negar essa doutrina, foi condenado pelos concílios da igreja, mais do que qualquer outra pessoa
na história eclesiástica.
Ao contrário da doutrina do pecado original, Finney acreditava que os seres humanos são capazes de escolher se desejam ser
corruptos por natureza ou redimidos, referindo-se à doutrina do pecado original como “um dogma sem lógica e fundamento
bíblico”. Em termos claros, ele negou a idéia de que os homens possuem uma natureza pecaminosa (ibid.). Por conseguinte, se
Adão nos leva ao pecado e isto ocorre não porque herdamos a sua culpa ou corrupção, e sim porque seguimos o seu triste
exemplo, tal idéia nos conduz a pensar logicamente que Cristo, o Segundo Adão, nos salva por meio de seu exemplo. Este é
exatamente o ponto aonde Finney chegou, ao explicar a doutrina da expiação.
A primeira coisa que temos de observar sobre a expiação, dizia Finney, é que Cristo não poderia ter morrido em favor do pecado
de qualquer outra pessoa, exceto o dele mesmo. Sua obediência à lei e sua perfeita justiça eram suficientes para salvar somente a
Si mesmo, mas não podiam ser aceitas em favor de outros. O fato de que toda a teologia de Finney resultou de uma intensa paixão
por aperfeiçoamento moral pode ser visto nesta afirmativa: “Se Cristo tivesse obedecido a lei como nosso Substituto, por que a
insistência bíblica sobre nosso retorno à obediência pessoal, apresentando esta obediência como um requisito fundamental para
nossa salvação?”.
Em outras palavras, por que Deus insiste em salvar-nos por meio de nossa obediência, se a obra de Cristo foi suficiente? O leitor
recordará as palavras do apóstolo Paulo, no que concerne a este assunto: “Não anulo a graça de Deus; pois, se a justiça é
mediante a lei, segue-se que morreu Cristo em vão (Gl 2.21). a resposta de Finney parece concordar com este versículo. A
diferença é esta: ele não tinha dificuldade para aceitar ambas as premissas.
É evidente que essa não é toda a verdade, pois Finney acreditava que Cristo havia morrido por algum motivo – não por alguém,
mas por alguma coisa. Em outras palavras, Cristo morreu por um objetivo e não por um povo. O objetivo da morte dEle foi reafirmar
o governo moral de Deus e conduzir-nos à vida eterna por meio de seu exemplo, assim como o exemplo de Adão nos incita ao
pecado. Por que Cristo morreu? Deus sabia que “a expiação ofereceria às criaturas os mais elevados motivos a serem imitados. O
exemplo é a mais poderosa influência moral que pode ser praticada... Se a benevolência manifestada na expiação não subjuga o
egoísmo dos pecadores, a situação destes é desesperadora”. Portanto, não somos pecadores desesperados que precisam ser
redimidos, e sim pecadores desorientados que necessitam de uma demonstração de altruísmo tão co-movente, que seremos
motivados a abandonar o egoísmo. Finney não apenas acreditava que a teoria de uma expiação de “influência moral” era a
principal maneira de se entender a cruz; ele explicitamente negava a expiação vicária, pois esta “admite que a expiação foi
literalmente o pagamento de um débito, que, conforme vimos, não é coerente com a natureza da expiação... É verdade que a
expiação, por si mesma, não assegura a salvação de qualquer pessoa”.
Agora consideremos a opinião de Finney a respeito de como se aplica a expiação. Rejeitando o calvinismo ortodoxo dos antigos
presbiterianos e congregacionais, Finney argumentou tenazmente contra a crença de que o novo nascimento é um dom de Deus,
insistindo que “a regeneração consiste na atitude do próprio pecador mudar sua intenção, sua preferência e sua escolha definitiva;
ou mudar do egoísmo para o amor e a benevolência”, impulsionado pela influência moral do comovente exemplo de Cristo. “A
pecaminosidade original, a regeneração física e todos os dogmas resultantes e similares a estes opõem-se ao evangelho e são
repulsivos à inteligência humana”.
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Não levando em conta o pecado original, a expiação vicária e o caráter sobrenatural do novo nascimento, Finney prosseguiu
adiante e atacou “o artigo pelo qual a igreja mantém-se de pé ou cai” – a justificação gratuita exclusivamente pela fé.
Os reformadores protestantes insistiam, com base em evidentes textos bíblicos, que a justificação (no grego, “declarar justo”) era
um veredicto forense (isto é, “judicial”). Em outras palavras, enquanto o catolicismo romano sustentava que a justificação era um
processo para tornar melhor uma pessoa má, os reformadores argumentavam que a justificação era um pronunciamento ou uma
declaração de que alguém possuía a retidão de outra pessoa (ou seja, Cristo). Portanto, a justificação
era um veredicto perfeito, outorgado de uma vez por todas, declarando que alguém permanecia íntegro desde o início da vida
cristã, e não em qualquer outra etapa desta.
As palavras-chaves da doutrina evangélica eram “forense” (significando “judicial”) e “imputação” (lançar na conta de alguém;
opondo-se à idéia de “infusão” de justiça na alma da pessoa”. Sabendo tudo isso, Finney declarou:
“É impossível e absurdo que os pecadores sejam declarados legalmente justos... Conforme veremos, há varias condições, mas
apenas um fundamento, para a justificação dos pecadores. Já dissemos que não existe uma justificação no sentido forense ou
judicial, e sim uma justificação fundamentada na ininterrupta, perfeita e universal obediência à lei. Isto, sem dúvida, é negado por
aqueles que asseveram que a justificação evangélica, ou a justificação de pecadores arrependidos, possui o caráter de uma
justificação forense ou judicial. Eles se apegam à máxima judicial de que aquilo que um homem faz através de um outro é
considerado como sendo feito por ele mesmo; portanto, a lei considera a obediência de Cristo como nossa, com base no fato de
que Ele a obedeceu por nós”.
A isto o próprio Finney respondeu: “A doutrina de uma justiça imputada, ou seja, que a obediência de Cristo à lei foi reputada como
nossa, fundamenta-se em uma suposição falsa e sem lógica”. Afinal de contas, a justiça de Cristo “poderia justificar somente a Ele
mesmo. Jamais poderia ser imputada a nós... Era naturalmente
impossível para Ele obedecer a lei em nosso favor”. Esta “interpretação da expiação como base da justificação dos pecadores tem
sido uma ocasião de tropeço para muitos”.
O conceito de que a fé é a única condição da justificação expressa “um ponto de vista antinomiano”, disse Finney. “Veremos que a
perseverança na obediência até ao fim é também uma condição para a justificação”. Além disso, a “santificação presente, no
sentido de plena consagração a Deus, é outra condição... da justificação. Alguns teólogos transformaram a justificação em uma
condição para a santificação, ao invés de fazerem da santificação uma condição para a justificação. Porém, conforme
observaremos, este é um conceito errado sobre a justificação”. Cada ato de pecado exige “uma nova justificação”. Referindo-se
“aos elaboradores da Confissão de Fé de Westminster” e ao ponto de vista de uma justiça imputada, Finney admirou-se,
afirmando: “Se isto não é antinomianismo, não sei o que é”. Essa imputação lega era irracional para ele, por isso concluiu:
“Considero estes dogmas como fantasiosos, descrevendo mais um romance do que um sistema teológico”. Na seção em que falou
contra a Assembléia de Westminster, ele finalizou dizendo:
“As relações entre o antigo ponto de vista da justificação e o ponto de vista da depravação é óbvio. Os membros da Assembléia
sustentam, conforme já vimos, que a constituição do homem, em todas as suas partes e faculdades, é pecaminosa. Naturalmente,
um retorno à santidade pessoal, no presente, no sentido de uma completa conformidade à lei de Deus, na opinião deles, não pode
ser uma condição para justificação. Eles precisam ter uma justificação enquanto ainda permanecem em certo grau de pecado. Isto
tem de ser realizado por meio da justificação imputada. O intelecto se revolta diante de uma justificação em pecado. Portanto, um
método foi inventado para que os olhos da lei e de seu doador sejam retirados do pecador e focalizados em seu Substituto, que
obedeceu perfeitamente a lei”.
Finney chamou essa doutrina de “outro evangelho”. Insistindo que a descrição realística de Paulo em Romanos 7 realmente se
refere à vida do apóstolo antes que ele houvesse atingido a “perfeita santificação”, Finney ultrapassou Wesley ao argumentar em
favor da possibilidade da santificação completa nesta vida. John Wesley dizia que é possível para o crente atingir a plena
santificação, mas, quando reconheceu que o melhor dos crentes peca, ele acomodou-se à realidade dos fatos, afirmando que a
experiência da “perfeição cristã” era uma questão de coração e não de ações. Em outras palavras, um crente pode ser
aperfeiçoado em amor, de modo que este amor se torne a única motivação para as suas atitudes, enquanto ocasionalmente
comete erros. Finney rejeitou esta opinião e insistiu que a justificação está condicionada à perfeição completa e total – ou seja, a
“inteira conformidade à lei de Deus”, e o crente pode fazer isso; mas, quando ele transgride em algum ponto, uma nova justificação
é exigida.
Conforme ressaltou eloqüentemente B. B. Warfield, o teólogo de Princeton, há duas religiões na história da raça humana: o
paganismo – da qual o pelagianismo é uma expressão – e a redenção sobrenatural. Juntamente com Warfield e outros que com
seriedade advertiram seus irmãos sobre os erros de Finney e seus sucessores, também temos de avaliar as idéias amplamente
heterodoxas dos protestantes americanos. Com suas raízes no avivalismo de Finney, talvez o protestantismo liberal e o
protestantismo evangélico, afinal de contas, não estejam tão afastados um do outro! As “Novas Medidas” de Finney, semelhantes
às do moderno Movimento de Crescimento de Igreja, tornaram a escolha do homem e as emoções o centro do ministério da igreja,
ridicularizaram a teologia e substituíram a pregação de Cristo por uma pregação voltada a conversões.
Com base no moralismo natural advogado por Finney, as campanhas políticas e sociais dos cristãos alicerçaram sua fé na
humanidade e em seus próprios recursos para a salvação de si mesma. Ecoando um pouco de deísmo, Finney declarou: “Na vida
espiritual nada existe além das capacidades naturais; ela consiste totalmente no correto exercício dessas capacidades. É apenas
isto e nada mais. Quando a humanidade se torna verdadeiramente religiosa, as pessoas são capacitadas a demonstrar esforços
que eram incapazes de manifestar antes. Exercem apenas capacidades que tinham antes, e utilizavam de maneira errônea, e
agora as empregam para a glória de Deus”. Deste modo, visto que o novo nascimento é um fenômeno natural, o mesmo ocorre ao
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avivamento: “Um avivamento não é um milagre, tampouco depende deste, em qualquer sentido; é simplesmente um resultado do
filosófico da correta utilização dos meios estabelecidos, assim como qualquer outro resultado produzido pelo emprego destes
meios”. A crença de que o novo nascimento e um avivamento dependem necessariamente da atividade divina era perniciosa para
Finney. Ele disse: “Nenhuma doutrina é mais perigosa do que esta para o progresso da igreja, e nada pode ser mais absurdo”.
Quando os líderes do Movimento de Crescimento de Igreja reivindicam que a teologia impede o crescimento da igreja e insistem
que, não importando o que determinada igreja acredita em particular, o crescimento é uma questão de seguir os princípios
adequados, estes líderes estão demonstrando seu débito a Finney. Quando os líderes do movimento Vineyard exaltam a iniciativa
subcristã de Finney, bem como o gritar, a desordem, o falar alto, o rir e outros fenômenos estranhos, com base na idéia de que
“isto funciona” e que devemos julgar a verdade destas coisas pelos frutos produzidos, esses líderes estão seguindo idéias de
Finney e de William James, o pai do pragmatismo americano. Este último declarou que uma verdade precisa ser julgada de acordo
com “seu valor na prática”.
Deste modo, na teologia de Finney, Deus não é soberano, o homem não é pecador por natureza, a expiação realmente não é um
pagamento pelo pecado, a justificação por meio da imputação é um insulto à razão e à moralidade, o novo nascimento é apenas o
resultado da utilização de técnicas bem-sucedidas, e o avivamento é o resultado natural de campanhas inteligentes. Em sua
recente introdução à edição do bicentenário da Teologia Sistemática de Finney, Harry Conn recomenda o pragmatismo de
Finney:“Muitos servos de Deus procuram um evangelho que‘funciona’; sinto-me feliz em declarar que o acharão nesta obra”.
Conforme Whitney R. Cross cuidadosamente documentou em seu livro, The Burned – Over District; The Social and Intellectual
History of Enth-usiastic Religion in Western New York, 1800-1850, todo o território em que com mais freqüência se realizavam os
avivamentos de Finney era também o berço dos cultos perfeccionistas que infestaram aquele século. Um evangelho que “funciona”
hoje, para os zelosos perfeccionistas, apenas cria os supercrentes iludidos e esgotados de amanhã.
É desnecessário dizer que a mensagem de Finney é radicalmente contrária à fé evangélica, assim como as diretrizes fundamentais
de movimentos vistos ao nosso redor, que demonstram as marcas de Finney: o avivalismo, o perfeccionismo e o emocionalismo
pentecostal, e as tendências anti-intelectuais e anti-doutrinárias do fundamentalismo e evangelicalismo moderno. Foi por
intermédio do “Movimento da Vida Superior” (Higher Life Moviment), do final do século XIX e início do século XX, que o
perfeccionismo de Finney chegou a dominar o recém-nascido movimento dispen- sacionalista através de Lewis Sperry Chafer,
fundador do Seminário de Dallas e autor de He That Is Spiritual (Aquele que é Espiritual). Finney, entretanto, não é o único
responsável; ele é mais um produto do que um produtor. Apesar disso, a influência que ele exerceu e continua exercendo é
abrangente.
O avivalista não apenas abandonou o princípio fundamental da Reforma (a justificação), tornando-se um rebelde contra o
cristianismo evangélico, como também rejeitou as doutrinas que têm sido acreditadas por católicos e protestantes (tais como o
pecado original e a expiação vicária). Por isso, Finney não é simplesmente um arminiano, mas um pelagiano. Ele não é apenas um
inimigo do protestantismo evangélico mas também do cristianismo histórico, no mais abrangente sentido da palavra.
Não enfatizo estas coisas com satisfação, como se desejasse regozijar-me em denunciar os heróis dos evangélicos americanos.
Porém, sempre é bom, especialmente quando perdemos algo de valor, retroceder nossos passos, a fim de determinar onde ou
quando, pela última vez, o tínhamos em nossa possessão. O propósito deste artigo é focalizar, com sinceridade, o grave
afastamento do cristianismo bíblico promovido através do avivalismo americano. Até que sejamos capazes de encarar este
afastamento, estaremos perpetuando um caminho perigoso e distorcido. Em uma afirmativa, Finney estava absolutamente correto:
o evangelho afirmado e defendido pelos teólogos de Westminster (os quais ele atacou diretamente) e por todos os evangélicos é
“outro evangelho”, no sentido de ser distinto daquele que Finney proclamava. A grande questão do momento é: Qual destes é o
nosso evangelho?