quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

CERTEZA DE SALVAÇÃO - A NECESSIDADE DE SE OBTER A CERTEZA DE SALVAÇÃO

Quando imaginamos que Deus é perfeito em seu ser e em tudo que faz; quando imaginamos que o céu, lugar da habitação de Deus, é um lugar perfeito; e, então, olhamos para a nossa natureza pecaminosa, não há como não reagir de forma temerosa quanto ao destino eterno de nossas vidas. Por isso, mesmo certos do amor de Cristo, e tendo vivido a experiência do novo nascimento, a carne que morre dentro de nós sempre nos leva a duvidar da suficiência do que foi feito pelo Senhor Jesus, na cruz do Calvário, pagando, ali, a nossa dívida diante do Pai.
A contemplação da nossa miséria espiritual nos faz imaginar que há a necessidade de se fazer alguma coisa para “retribuir” o amor de Deus, “pagando” pelo menos a metade do que seu Filho amado fez por nós. Assim, se estabelece um conflito profundo dentro de nós, pois, se por um lado temos a certeza do amor de Cristo, por outro temos a plena consciência de não merecermos tal amor.
Este embate cria a dúvida, como já vimos anterioremente, sobre a certeza de nossa salvação. E enquanto permitirmos que tal embate ocorra dentro de nós; enquanto permitirmos que a incerteza de nossa salvação domine nossa fé, não teremos como progredir espiritualmente. O resultado óbvio deste conflito é o surgimento de superstições que nublam a glória da obra da salvação em nós e nos impedem de crescer, amadurecer, no conhecimento do nosso Deus, revelado em seu Filho amado, o Senhor Jesus.
Por isso, há a ncessidade de lutarmos contra esta dúvida que assola o coração de muitos servos fiéis a Cristo, mas que, am algum momento, se permitiram olhar para si mesmos, quando deveriam contemplar a Cristo. Neste sentido, a Confissão de Fé continua o parágrafo III com o seguinte esclarecimento:
...contudo, sendo pelo Espírito habilitado a conhecer as coisas que lhe são livremente dadas por Deus, ele pode obtê-la (a certeza de salvação) sem revelação extraordinária, no devido uso dos meios ordinários. É, pois, dever de cada um ser diligente em tornar certas sua vocação e eleição, a fim de que, por esse modo, seja o seu coração, no Espírito Santo , dilatado em paz e deleite, em amor e gratidão para com Deus, no vigor e alegria, nos deveres da obediência, que são os frutos próprios desta segurança...

Nas palavras da Confissão de Fé, há duas realidades a serem observadas em nossa luta contra a incerteza de salvação que assola nossos corações quando olhamos para nós mesmos e nossos méritos. A primeira é que tal certeza pode ser obtida. Como ela não faz parte essencial da salvação (como vimos anteriormente), ela pode ser obtida ao longo da nossa caminhada de fé. Para tanto, dois são os fatores que contribuem para isto, o conhecimento das coisas que Deus revelou a nós por meio do seu Espírito e o uso dos meios ordinários. No primeiro caso, à medida que crescemos no conhecimento da verdade de Deus, revelada em Sua Palavra, nossos corações são levados a contemplar não somente a miserabilidade do nosso pecado, mas também a abundante graça de Deus. Todavia, tal conhecimento só é alcançado quando somos habilitados pelo Espírito Santo, o que chamamos na teologia reformada de “iluminação”. Há a necessidade que o Espírito Santo abra os nossos olhos e os nossos corações para entendermos de forma clara a suficiência de Jesus e nossa total incapacidade de fazer qualquer coisas para a nossa redenção; e, então, levar-nos a descansar na fé que depositamos no salvador.
É aqui, neste último ponto, que muitos criam suas superstições, pois esquecem que o conhecimento que o Espírito dá ao povo de Deus não vem por meios místicos, esotéricos, mas ordinários, tal como Ele determinou que o fosse em sua Palavra. Daí, se diz na Donfissão de Fé que a certeza de salvação pode ser obtida “no uso devido dos meios ordinários”.
Devido a pobreza teológica do meio evangélico brasileiro, quando falamos de “meios ordinários”, muitos ficam sem saber quais são. Primeiramente, vale explicar que por “meios ordinários” a Confissão de Fé se refere aos meios instituídos por Deus, em Sua Palavra, para gerar crescimento espiritual na vida dos seus filhos. Tais meios ordinários são, também, chamados de “meios ordinários da graça de Deus”, ou seja, os meios pelos quais Deus opera a sua graça em nossos corações.
Uma vez entendido isto, o segundo ponto a ser explicado é: quais são os meios ordinários da graça de Deus. O exame das Escrituras apontam para três meios: a Palavra, os Sacramentos (batismo e Ceia do Senhor) e a oração. Todavia, o maior deles é a Palavra, que orienta e infunde valor à comunhão dos sacramentos a à oração. Ou seja, sem a Palavra de Deus, os sacramentos e a oração ficam destituídos de sentido e eficácia.
Voltando ao nosso tópico, a certeza de salvação pode ser obtida por meio do uso adequado, bíblico, dos meios ordinários da graça de Deus. O estudo das Sagradas Escrituras, a participação no batismo e na Ceia do Senhor (momentos que afirmamos nossa fé e renovamos nossa aliança com o Senhor, mediante a obra de Jesus, e a oração (que sujeita nossos corações à vontade de Deus) nos levam, dia-a-dia, a experimentar o poder eficaz daquilo que Cristo fez por nós na cruz do Calvário.
Entendido que a certeza de salvação pode ser obtida pelo filho de Deus, regenerado pelo sangue do Cordeiro, a Confissão de Fé exorta que é “dever de cada um ser diligente em tornar certas sua vocação e eleição”, o que está de acordo com aquilo que o apóstolo Pedro ensina, quando diz: “Por isso irmãos, procurai, com diligência cada vez maior, confirmar a vossa vocação e eleição; porquanto, procedendo assim, não tropeçareis em tempo algum” (2 Pe 1.10). A advertência do apóstolo encoraja aos crentes a fim de que se apropriem da certeza de sua salvação, indicados no texto pelos conceitos de vocação e eleição, a fim de que não tropecem.
O crente não se dará por satisfeito até que a doce certeza da salvação lhe tenha chegado ao coração e então possa permanecer firme, descansando em seu salvador. É interessante que tal passagem se encontre num contexto de exortação ao progresso espiritual. Isto porque, a certeza de salvação é essencial para o progresso da fé. Como afirma o Dr. Sproul:
A água que as nossas almas necessitam para a sua sobrevivência é a convicção da salvação. Esta convicção nem sempre vem imediatamente após a conversão. De fato, em alguns casos ela pode permanecer enganosa. Contudo, a obtenção da convicção total não é somente um privilégio espiritual para o cristão, ela é também um dever.

Enquanto os nossos corações não forem tomados pela certeza do perdão de Deus e da salvação que Ele nos ofereceu em Seu Filho Jesus, não teremos como progredir espiritualmente; andaremos como crianças assustadas, inseguras quanto ao amor de seus pais por elas; andaremos assustados com as investidas de Satanás contra as nossas vidas; andaremos desorientados, apesar de salvos. Assim, é mister que cresçamos no conhecimento da Palavra de Deus, participemos dos sacramentos e prezemos a vida de oração, a fim de que nossos corações sejam inundados pela certeza da suficiência daquilo que Jesus operou em nós.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

É POSSÍVEL, AO CRENTE, UMA INSEGURANÇA QUANTO A SUA CERTEZA DE SALVAÇÃO

Durante 8 anos tive o privilégio de pastorear a Igreja Presbiteriana de Cruz das Almas, em Tietê-SP. Ali pude amadurecer muito da minha caminhada espiritual, na convivência com irmãos e irmãs que viviam a graça de Cristo. Sou muito grato a Deus por ter trabalhado ali. Até hoje sinto falta desta convivência. Bem, foi ali que conheci uma irmã que ilustra bem esta questão do nosso assunto, irmã Chiquinha. Nunca tive dúvidas da conversão desta irmã, do seu coração firmado em Cristo, mas em vários momentos ela me expressou o medo de não estar salva. Sempre que isto acontecia, costumava repassar com ela a razão de sua fé em Cristo, na suficiência da obra do nosso Senhor e Salvador na cruz do Calvário, por nós. Então, voltávamos ao porto-seguro da jornada.
Esta sensação ou sentimento de insegurança é contemplado nas Escrituras Sagradas. Por isso, a Confissão de Fé, no parágrafo III, diz: “Esta segurança infalível não pertence de tal modo à essência da fé, que um verdadeiro crente, antes de possuí-la, não tenha de esperar muito e lutar com muitas dificuldades...” Observemos que a declaração diz que "a segurança infalível não pertence...à essência da fé", o que implica que é possível crer, de fato, em Cristo e na eficácia de sua obra, sem que isto comunique o conforto da certeza de salvação. Exatamente porque a certeza da salvação não faz parte da essência da fé esta pode se fazer sentir ausente do coração do crente. Reisinger tenta explicar esta distinção com uma analogia, onde nos diz que a fé é a raiz e a certeza é a flor. Com isto, o que se propõe é que a certeza surgirá ao seu tempo, com o cultivo. Mas, se temos certeza da suficiência da obra de Jesus para redenção de todo o que crê, por que podemos sentir insegurança quanto à nossa salvação?
João Calvino, refletindo sobre o assunto, disse: "Quando ensinamos que a fé é certa e segura, não imaginamos uma certeza tal que não seja tentada por alguma dúvida, nem concebemos uma espécie de segurança ao abrigo de toda inquietude; ao contrário, afirmamos que os fiéis precisam sustentar uma luta ininterrupta contra a desconfiança que sentem em si mesmos" (Institución de la religion cristiana, p. 422).
Da declaração de Calvino, percebemos que dúvidas podem se levantar no coração dos eleitos de Deus, dúvidas tais que podem causar a insegurança quanto ao estado dos seus corações. Estas podem ser de diversas ordens, entre as quais contamos:
• A lembrança, constante, dos pecados passados. Muitas pessoas vem a Cristo por meio de uma experiência dramática de vida, e suas conversões, para muitos, parecem forjadas, como uma espécie de fuga do que outrora fizeram. Outros, terão seus pecados lançados diante de si por meio de acusações que lhes farão; tais acusações podem partir ou do próprio coração, ou dos outros, ou de Satanás.
• A percepção de suas próprias fraquezas na luta contra o pecado. A salvação, em Cristo, não anula de imediato o velho homem, sujeito ao pecado; em nossa natureza recebemos a “mente de Cristo”, “um novo coração”, que passa a fazer frente à nossa natureza corrompida e crucificada com Cristo. Porém, como a crucificação não mata de imediato o crucificado, mas o faz lentamente, assim também, aqueles que morreram com Cristo, morrem lentamente, à medida que a vida de Cristo neles cresce. Por isso, desejosos de uma nova vida, livre das tentações do pecado, muitos crentes fiéis a Jesus se veem em dúvidas quanto à sua salvação ao perceberem que certos desejos pecaminosos ainda encontram lugar em suas vidas.
• A inquietação de nada termos feito para a nossa salvação. Estamos acostumados a fazermos alguma coisa para merecermos alguma retribuição. É difícil, numa sociedade como a nossa, cada vez mais individualista e ambicioda, nos sentirmos confortáveis com a idéia de incapacidade pessoal para alguma coisa. Assim, influenciados pelo humanismo secular, achamos que a salvação dependerá de nossas forças, nossas obras, nossa piedade, etc. Então, quando vemos a grandea da obra de Jesus, nos sentimos desconfotáveis em apenas aceitarmos o que Ele nos oferece, a salvação. Por outro lado, sabemos que precisamos da oferta, e então a aceitamos, não deixando, porém, de achar que precisamos fazer alguma coisa para nos tornarmos merecedoras dela. Tal inquietação se esquece que “pela graça sois salvos, e isto não vem de vós, é dom de Deus”.
• A compreensão da santidade de Deus e a incapacidade de salvar-se a si mesmo. Muitos irmãos e irmãs, durante a caminhada cristã, compreendem de tal forma a beleza da santidade do Salvador Jesus que, ao olharem para si mesmas, não veem em si mesmas nada de atrativo para que Deus lhes escolhessem; e devido à mentalidade humanista de que recebemos benefícios por méritos próprios, esquecem que a salvação oferecida é gratuita, resultado daquilo que Cristo fez pelos eleitos de Deus. O amor de Deus é incondicional, não é meritório. A santidade do salvador deve ser contemplada e isto deve nos desafiar a vivermos de forma digna o chamado que dele recebemos; também deve nos levar a adoração daquele que por amor, se entregou na cruz por pecadores miseráveis como nós.

Estas são algumas possíveis razões para a dúvida que sobressalta o coração dos eleitos de Deus quanto à certeza de sua salvação. Todavia, como disse Calvino, é preciso sustentar uma luta ininterrupta contra a desconfiança que sentimos. Para tanto, é necessário olhar “firmemente para o autor e consumador da nossa fé, Jesus. É nele, naquilo que ele realizou que descansamos a nossa salvação. Não devemos olhar para nós mesmos, mas para o Senhor que nos redimiu de toda a acusação. Ainda que as pessoas ou o diabo, diariamente, nos tente atormentar com nossos pecados passados, devemos nos lembrar que fomos justificados em Jesus e que, portanto, “nenhuma acusação há sobre os eleitos de Deus”.
Numa certa ocasião, no Seminário Presbiteriano do Sul (Campinas-SP), onde estudei, um aluno deu uma resposta que me marcou sobre o nosso caminhar pela fé olhando para Jesus. Este rapaz era um coreano muito piedoso, que costumava levantar-se na madrugada para buscar ao Senhor. Sendo obrigado a ler um livro de um teólogo liberal para fazer um trabalho, começou a ser vítima das gozações de outros colega liberais. Um dia, um destes colegas liberais lhe disse: “lendo livros assim você vai acabar virando liberal e vai perder a fé”. Aquele irmão piedoso lhe respondeu: “O Senhor Jesus deu a fé, portanto, só ele pode tirar”. Isto é olhar para Cristo, na certeza de que aquele que foi confiado às suas mãos ninguém os pode arrebatar. Como um dia perguntou o apóstolo Paulo: “Quem nos separará do amor de Cristo?” (Rm 8.35).