sábado, 9 de janeiro de 2010

DONS ESPIRITUAIS - A Natureza dos Dons

I. A NATUREZA DOS DONS

E a graça foi concedida a cada um de nós segundo a proporção do dom de Cristo. Por isso, diz: Quando ele subiu às alturas, levou cativo o cativeiro e concedeu dons aos homens. (Ef 4.7,8).

Via de regra, todo estudo acerca dos dons espirituais parte da sua realidade manifesta à Igreja no Novo Testamento. Todavia, tais manifestações se projetam no todo da revelação da Escritura e devem ser observadas a partir da relação direta com a História da Salvação, criação, queda e redenção. Os dons não surgem do nada, como novidade no Novo Testamento, são, antes, manifestações conhecidas desde o Antigo Testamento, na sua maioria. A diferença reside na frequência operacional deste na vida da comunidade de fé. Enquanto no Antigo Testamento se presenciavam manifestações esporádicas, no Novo Testamento constituem a base de dinamismo, serviço e unidade dentro do Reino de Deus.
Outra diferença importante é que no Antigo Testamento os dons estavam restritos à algumas pessoas, escolhidas de forma especial para o exercício de algo pretendido pelo Senhor Deus. Já no Novo Testamento, estes dons são revelados e entregues a todos na comunidade de fé em Cristo Jesus.
O texto de Ef 4.7,8 nos ajuda a perceber estas mudanças. Diz primeiro que a graça (charis) foi concedida “a cada um de nós”. Esta graça se refere à obra salvífica manifesta aos redimidos, totalmente baseada no dom (doreas) de Cristo; ou seja, na sua obra redentiva efetuada na cruz do Calvário.
A partir deste ponto surge aquilo que é surpreendente: os dons (dómata) são entregues aos homens, pois “ao subir” (ascensão), “levou cativo o cativeiro”. Esta expressão é encontrada no Sl 68.18 referindo-se aos despojos de uma batalha. O apóstolo Paulo toma esta cena para fundamentar a teologia dos dons que deve estar presente em nossa compreensão: os dons foram dados à igreja a partir do saque que Cristo fez ao pecado derrotando seus aliados: o mundo, o diabo e a carne (2.1-3). Enquanto mortos nos delitos e pecados, os homens não podiam experimentar o dinamismo da vida espiritual; ressuscitados, recebem dons para amadurecerem e servirem ao seu Deus e o próximo dentro do Reino, resgatando propósitos anunciados desde a criação.
1. Dons e Criação
“No princípio criou Deus os céus e a terra” (Gn 1.1). Assim começa a descrição da criação. De um cosmo imenso o Criador toma a “terra” como alvo de um projeto, e apesar de ser “sem forma e vazia”, Ele a organiza (vv.3-19) e passa a povoá-la (vv. 20-26). Tendo feito tudo isto, concebe o ser humano como a expressão máxima de sua obra cobrindo-lhe de glória e honra (Sl 8.5), fazendo-o “à sua imagem e semelhança”. Isto faz recair sobre o ser humano três mandatos específicos para os quais havia sido criado:
a. Mandato Cultural, “tenha ele domínio sobre...” (1.26) e “sujeitai-a; dominai...” (1.28b). Este mandato colocava sobre o homem a responsabilidade pelos rumos da criação, os cuidados e gerenciamento daquilo que havia sido criado por Deus.
b. Mandato Social, “Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra...” (1.28a). Implicava em dar à sociedade as marcas de Deus através da descendência santa. Os homens refletiriam a glória de Deus no mundo, nas suas formas organizacionais e relacionais.
c. Mandato Espiritual, “De toda árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás” (2.16,17). Com este mandato Deus pactuava com o homem estabelecendo a obediência à sua voz como chave de regência da vida e dos mandatos anteriores. O mundo deveria refletir a direção e vontade do seu Criador através dos seres humanos.
Porque fomos feitos “à imagem e semelhança de Deus”, havia em nós todos os dons necessários para executarmos aquilo que nos havia sido confiado. Estes dons eram inerentes, portanto, não havia distinção entre o que é espiritual e natural. A relação do ser humano com Deus fazia com que tudo fosse espiritual e natural. Espiritual porque havia sido conferido por Deus, e “Deus é espírito” (Jo 4.24), e natural porque era próprio do ser humano a capacidade para realizar a vontade de Deus.
Mas com a entrada do pecado no mundo, tudo foi alterado. Resumidamente podemos dizer que o pecado quebrou:
a. A comunhão com Deus, pois o homem passou a esconder-se do seu Criador (3.8), a temê-lo (3.10) e a acusá-lo do seu próprio pecado (“a mulher que (tu) me deste...”, 3.12). Como consequência, passamos a experimentar a morte, tanto no plano espiritual, quanto no plano físico.
b. A comunhão com seu próximo, pois o próximo se torna um estranho, um diferente (“a mulher que...”, 3.12) e responsável pelo meu erro (“...ela me deu...”, 3.12). Pode-se ver este problema ainda na relação Caim e Abel no cap.4.8-16. Como resultado disto, temos a inimizade, o ódio entre as pessoas, fruto do egoísmo pessoal de cada um.
c. A comunhão com a criação, pois a natureza foi amaldiçoada por causa do homem (“maldita é a terra por tua causa...”, 3.17a), e se tornou para ele uma tarefa árdua, pesarosa (“em fadiga obterás dela o sustento durante os dias de tua vida”, 3.17b).
Cumprir os mandatos culturais e sociais se tornou uma tarefa difícil, pesarosa e, até mesmo, dolorosa. Conviver com a morte, a dor e o sofrimento se tornou algo comum para o ser humano. Mas mesmo assim, com toda dificuldade, estes mandatos ainda podiam ser executados, e sobre estes, diretamente, todos nós seremos cobrados e julgados no dia do juízo. Mas o mandato espiritual se tornou impossível ao homem, pois estava morto “nos seus delitos e pecados”. Em Caim vemos o abandono total dos mandatos e a ascensão de uma descendência de oposição direta a Deus.
Diante disto, Deus separa uma descendência que lhe pertenceria e levaria à cabo seu plano salvífico. Esta descendência toma forma a partir de Sete, filho de Adão, dando início à caminhada messiânica prometida em Gn 3.15. E é nesta descendência que se manifestam os dons do Espírito no Antigo Testamento, a fim de capacitá-los a realizar o mandato espiritual até que tudo se cumprisse em Jesus.

2. Dons e Profecias Messiânicas
Ao longo da jornada da semente santa, Deus foi capacitando servos para manterem seu povo debaixo de sua vontade. Estes servos foram capacitados das mais variadas manifestações de Deus (curas, milagres, evangelismo, sabedoria/conhecimento, etc.), mas principalmente de profecias. Estas assumiram um duplo caráter distinto:
a. Profecias Predicativas, que tinham por finalidade anunciar a Lei de Deus e chamar o povo ao arrependimento e obediência ao Senhor. Estas profecias perfazem um total de 95% de todo o Antigo Testamento, pois começam de Josué-2 Reis (com exceção de Rute) e depois de Isaías à Malaquias.
b. Profecias Preditivas, que tinham por finalidade anunciar os atos futuros do Senhor no cumprimento do projeto salvífico. Assim, 5% referiam-se à predição, sendo basicamente de cunho messiânico.
É dentro do contexto das profecias preditivas, messiânicas, que encontramos a promessa dos dons espirituais como sendo uma experiência comum, frequente e permanente entre o povo de Deus, pois se dizia que na era messiânica o Espírito seria derramado sobre o povo de Deus e os dons lhe seriam as marcas (e.g. 2.28, cf. Atos 2.16-21).
E de fato, quando Cristo vem a terra e cumpre todo o plano salvífico e volta aos céus, é derramado sobre o seu povo dons, e o apóstolo Pedro retoma a promessa feita pelo profeta Joel para explicar o que estava acontecendo na comunidade de fé.
Agora vejamos, isto está de acordo com o que o apóstolo Paulo havia anunciado, quando Cristo subiu levou consigo cativo o cativeiro e deu “dons” aos homens, pois o poder do pecado havia sido destronado, o inferno envergonhado, o mundo subjugado e condenado, e os homens, salvos pela fé em Jesus, haviam sido libertos da morte e da condenação, encontravam-se novamente livres, sendo revestidos de um novo poder para executarem “a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”.
A obra salvífica nos reconciliou com Deus e com o nosso próximo, derrubando a barreira da inimizade e da desigualdade (Ef 2.11-22). Todavia, é interessante observar que todas estas bênçãos nos foram asseguradas pela inserção do Espírito em nós, o qual nos redime e nos unifica em Cristo (1.13, 2.18).
A redenção o Espírito aplica em nós através da regeneração e a unidade e aperfeiçoamento do Corpo de Cristo por meio dos dons, administrados soberanamente por Ele.

2 comentários:

Unknown disse...

Olá muito bom o estudo. Estará postado no site dos Obreiros.

Airton Williams disse...

amados irmãos, a paz de Cristo. agradeço a gentileza de postarem o estudo em vosso site www.osobreiros.com.br Um forte abraço.